sexta-feira, 26 de novembro de 2010

Pela liberdade de crer - parte 1/4

Do ponto de vista filosófico e democrático, a liberdade de crença - e de crítica a crença - deve ser assegurada de forma ampla e total.

Prof. J. Vasconcelos*

A humanidade sofreu por muito tempo com a ausência da liberdade dos cidadãos comuns, mormente no que concerne ao seu direito de dispor de suas próprias ideias e crenças. Com efeito, remontando à Antiguidade e compreendendo todos os diversos períodos até a Revolução Francesa, podemos calcular mais de 5 mil anos em que os humanos vinham sendo cerceados na sua faculdade de emitir os seus conceitos pessoais, com exceção apenas nas cidades-estados que empregaram o regime de democracia pura, por volta dos séculos 6, 5 e 4 a.C.

Ideias de cunho político praticamente não seriam possíveis, a não ser referências sobre a maneira como os poderosos atuavam em suas altas funções. Todavia, jamais havia conceituações dos cidadãos comuns sobre a natureza e legitimidade dos privilégios e da assunção aos poderes pelos soberanos, sacerdotes e nobres. Qualquer atitude nesse sentido poderia signifi car a incursão no crime de lesa-majestade.

Com respeito a outras ideias, como as religiosas, menos ainda. Interpretações diferentes dos costumes e credibilidade cultural seria suicídio total. As religiões imperantes eram oriundas dos deuses conforme os ensinamentos dos sacerdotes e, assim, de contexto absoluto e incontestável. Posições estranhas das adorações e rituais predominantes resultavam na execração pela própria coletividade. Além do mais, questionamentos e dúvidas sobre assuntos religiosos abalariam o poder, o mando e as prerrogativas da classe sacerdotal, que usufruía da maior riqueza.

À falta de comunicação e desenvolvimento intelectual, é evidente que os cidadãos comuns pouco dispunham de crenças divergentes. A cultura era demasiadamente Zoroastro, na Pérsia, Amenófis IV-Akhenaton no Egito e Buda na Índia. Não se caracterizavam sequer como oposição às crenças vigorantes. Podemos caracterizá-las mais como acréscimos às próprias crenças existentes. Jesus Cristo, inclusive, não foi condenado por portar novas crenças e nova religião. Foi punido por exercer o sacerdócio à parte do ordenamento dos prelados oficiais.

Somente vamos encontrar na Grécia pessoas com ideias divergentes das crenças dominantes, com os filósofos. Todavia, o ambiente grego era mais acolhedor, embora não fosse totalmente liberado a ponto de os cidadãos poderem livremente manifestar crenças opostas às dominantes. Mesmo porque alguns filósofos foram perseguidos e processados sob a acusação de portarem ideias contrárias às crenças religiosas. Exemplo foi com o que aconteceu a Sócrates, Anaxágoras, Empédocles e outros.

Monopólio religioso
Na Idade Média, quando a religião cristã dominou os países europeus, a situação continuou igual à dos tempos anteriores: pouco progresso intelectual e deficientes meios de comunicação contribuíram para que os cidadãos comuns permanecessem com suas crenças inalteradas, não havendo, portanto o contraditório. À medida em que o Cristianismo avançava por toda parte do Império Romano, a Igreja Católica foi se organizando como uma poderosa força institucional, salientando-se uma poderosa classe sacerdotal. Com o vazio deixado pela queda do império, a Igreja enveredou por uma política de expansão e destruição das crenças nativas das regiões europeias, para tanto usando da persuasão e da força.

De sorte que, por todo lado a Igreja ia se fortalecendo como poder temporal e exterminando tudo quanto era diferente de suas crenças. Instaurava-se nas terras europeias o monopólio religioso, sem espaço para outras crenças. Elucidam os estudiosos que as religiões monoteístas são mais totalitárias e intolerantes à existência de outras crenças e outros deuses. Foi o caso do cristianismo. Quando o poder lhe caiu nas mãos, a Igreja envidou todos os seus esforços para o extermínio de qualquer vestígio de liberdade de crença.


http://filosofia.uol.com.br/filosofia/ideologia-sabedoria/26/artigo190474-1.asp



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