segunda-feira, 24 de agosto de 2009

Palavras do Presidente Oscar Arias da Costa Rica

Cúpula das Américas em Trinidad e Tobago, 18 de abril de 2009

"Tenho a impressão de que cada vez que os países caribenhos e
latinoamericanos se reúnem com o presidente dos Estados Unidos da América,
é para pedir-lhe coisas ou para reclamar coisas. Quase sempre, é para
culpar os Estados Unidos de nossos males passados, presentes e futuros. Não
creio que isso seja de todo justo..

Não podemos esquecer que a América Latina teve universidades antes que
os Estados Unidos criassem Harvard e William & Mary, que são as primeiras
universidades desse país. Não podemos esquecer que nesse continente, como
no mundo inteiro, pelo menos até 1750 todos os americanos eram mais ou
menos iguais: todos eram pobres.

Ao aparecer a Revolução Industrial na Inglaterra, outros países sobem nesse
vagão: Alemanha, França, Estados Unidos, Canadá, Austrália, Nova Zelândia e
aqui a Revolução Industrial passou pela América Latina como um cometa, e
não nos demos conta. Certamente perdemos a oportunidade.

Há também uma diferença muito grande. Lendo a história da América Latina,
comparada com a história dos Estados Unidos, compreende-se que a América
Latina não teve um John Winthrop espanhol, nem português, que viesse com a
Bíblia em sua mão disposto a construir uma Cidade sobre uma Colina, uma
cidade que brilhasse, como foi a pretensão dos peregrinos que chegaram aos
Estados Unidos.

Faz 50 anos, o México era mais rico que Portugal. Em 1950, um país como o
Brasil tinha uma renda per capita mais elevada que o da Coréia do Sul. Faz
60 anos, Honduras tinha mais riqueza per capita que Cingapura, e hoje
Cingapura em questão de 35 a 40 anos é um país com $40.000 de renda anual
por habitante. Bem, algo nós fizemos mal, os latinoamericanos.

Que fizemos errado? Nem posso enumerar todas as coisas que fizemos mal.
Para começar, temos uma escolaridade de 7 anos. Essa é a escolaridade média
da América Latina e não é o caso da maioria dos países asiáticos.
Certamente não é o caso de países como Estados Unidos e Canadá, com a
melhor educação do mundo, similar a dos europeus. De cada 10 estudantes que
ingressam no nível secundário na América Latina, em alguns países, só um
termina esse nível secundário. Há países que têm uma mortalidade infantil
de 50 crianças por cada mil, quando a média nos países asiáticos mais
avançados é de 8, 9 ou 10.

Nós temos países onde a carga tributária é de 12% do produto interno bruto
e não é responsabilidade de ninguém, exceto nossa, que não cobremos
dinheiro das pessoas mais ricas dos nossos países. Ninguém tem a culpa
disso, a não ser nós mesmos.


Em 1950, cada cidadão norteamericano era quatro vezes mais rico que um
cidadão latinoamericano. Hoje em dia, um cidadão norteamericano é 10 15 ou
20 vezes mais rico que um latinoamericano. Isso não é culpa dos Estados
Unidos, é culpa nossa.

No meu pronunciamento desta manhã, me referi a um fato que para mim é
grotesco e que somente demonstra que o sistema de valores do século XX, que
parece ser o que estamos pondo em prática também no século XXI, é um
sistema de valores equivocado. Porque não pode ser que o mundo rico dedique
100.000 milhões de dólares para aliviar a pobreza dos 80% da população do
mundo "num planeta que tem 2.500 milhões de seres humanos com uma renda de
$2 por dia" e que gaste 13 vezes mais ($1.300.000.000.000) em armas e
soldados.

*Como disse esta manhã, não pode ser que a América Latina gaste $50.000*
milhões em armas e soldados. Eu me pergunto: quem é o nosso inimigo? Nosso
inimigo, presidente Correa, desta desigualdade que o Sr. aponta com muita
razão, é a falta de educação; é o analfabetismo; é que não gastamos na
saúde de nosso povo; que não criamos a infraestrutura necessária, os
caminhos, as estradas, os portos, os aeroportos; que não estamos dedicando
os recursos necessários para deter a degradação do meio ambiente; é a
desigualdade que temos que nos envergonhar realmente; é produto, entre
muitas outras coisas, certamente, de que não estamos educando nossos filhos
e nossas filhas.

Vá alguém a uma universidade latinoamericana e parece, no entanto que
estamos nos sessenta, setenta ou oitenta. Parece que nos esquecemos de que
em 9 de novembro de 1989 aconteceu algo de muito importante, ao cair o Muro
de Berlim, e que o mundo mudou. Temos que aceitar que este é um mundo
diferente, e nisso francamente penso que os acadêmicos, que toda gente
pensante, que todos os economistas, que todos os historiadores, quase
concordam que o século XXI é um século dos asiáticos não dos
latinoamericanos. E eu, lamentavelmente, concordo com eles. Porque enquanto
nós continuamos discutindo sobre ideologias, continuamos discutindo sobre
todos os "ismos" (qual é o melhor? capitalismo, socialismo, comunismo,
liberalismo, neoliberalismo, socialcristianismo...) os asiáticos
encontraram um "ismo" muito realista para o século XXI e o final do século
XX, que é o *pragmatismo*. Para só citar um exemplo, recordemos que quando
Deng Xiaoping visitou Cingapura e a Coréia do Sul, depois de ter-se dado
conta de que seus próprios vizinhos estavam enriquecendo de uma maneira
muito acelerada, regressou a Pequim e disse aos velhos camaradas maoístas
que o haviam acompanhado na Grande Marcha: "Bem, a verdade, queridos
camaradas, é que a mim não importa se o gato é branco ou negro, só o que me
interessa é que cace ratos". E se Mao estivesse vivo, teria morrido de novo
quando disse que "a verdade é que enriquecer é glorioso". E enquanto os
chineses fazem isso, e desde 1979 até hoje crescem a 11%, 12% ou 13%, e
tiraram 300 milhões de habitantes da pobreza, nós continuamos discutindo
sobre ideologias que devíamos ter enterrado há muito tempo atrás.

A boa notícia é que isto Deng Xiaoping o conseguiu quando tinha 74 anos.
Olhando em volta, queridos presidentes, não vejo ninguém que esteja perto
dos 74 anos. Por isso só lhes peço que não esperemos completá-los para
fazer as mudanças que temos que fazer.

Muchas gracias."

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